domingo, 9 de dezembro de 2007

Fios do Tempo


"Nada muda. A vida não é uma linha reta, e o material nas páginas deste livro volta à memória a todo momento; somente a ordem é embaralhada, e o equilíbrio desloca-se. Sempre haverá novos projetos, novas direções, novos entusiasmos. Eu ainda me apegarei inutilmente a uma folha, meus cavalos continuarão a galopar em direções opostas, saltando e caindo, um pedaço brilhante de latão vermelho será tão sedutor quanto algo de valor infinito, e uma voz sempre murmurará: “Se você deixar este momento escapar, ele nunca mais retornará.”.
Quando eu era jovem costumava pensar: “’E possível chegar lá espiritualmente no tempo de uma vida”; na verdade, eu sentia uma obrigação moral de conquistar um ‘chegar lá’ antes que fosse tarde demais. Então, ao tornar-se mais clara a natureza de nossa condição humana, isso foi substituído pela idéia realista de que “serão necessárias muitas vidas”. Mas, aos poucos, o senso comum acabou prevalecendo e mostrou que ninguém é mais do que uma partícula transitória dentro de uma humanidade que luta, tateia, levanta-se e cai infinitamente, em busca de um “lá” que, mesmo em todo o curso futuro da história humana, pode nunca ser conhecido.
Contudo, a qualquer momento nós podemos encontrar um novo começo. Um começo tem a pureza da inocência e a liberdade ilimitada da mente do iniciante. O desenvolvimento é mais difícil, pois os parasitas, as confusões, as complicações e os excessos do mundo tomam conta quando a inocência dá lugar à experiência. Terminar é o mais difícil de tudo, mas, mesmo assim, é a desistência que proporciona a única experiência verdadeira de liberdade. Então, o fim torna-se mais uma vez um começo, e a vida tem a última palavra.
Em um vilarejo africano, quando um contador de histórias chega ao fim de sua fábula, ele coloca a palma da sua mão no chão e diz: Eu coloco a minha história aqui.” Então acrescenta: “Para que uma outra pessoa possa continuá-la em um outro dia.”

Peter Brook, Fios do Tempo